O SOM DA MÚSICA: RODOVIAS EM PAPIRO CIBERNÉTICO II

Wednesday, July 19, 2006

RODOVIAS EM PAPIRO CIBERNÉTICO II

Clique aqui e leia a primeira parte deste texto

HIPER-REALIDADE POP AO PASTICHE COLETIVO
ERA UMA VEZ... UM GÊNERO CHAMADO ROCK’N ROLL
Segunda parte da Resenha de Broken Toy Soldiers, o álbum dos Raconteurs (Work in Progress)

Não me diga seu nome, você é aquilo que consome! Chavão, no entanto às vezes é bacana ver um “bordão” desses avalizado por alguma eminência do campo das ciências humanas. Há poucos dias um estudioso definia na tevê tal panorama ao classificar o que você compra e ostenta como espécie de signo de afirmação do indivíduo na sociedade de consumo, esta mesma que naturalmente tende a evoluir para sociedade de controle. E no que concerne ao âmbito musical, este “indivíduo” teoricamente dotado de particularidades que o diferem dos demais não fossem estas cafetizadas em prol do senso comum ditado pelos macro-aparatos de padronização de costumes ditados pelas ferramentas da comunicação massiva, ao ser simplesmente tragado em reação automática pela cadeia de mecanismos visando nada mais que o saciar da demanda de uma produção faz com que a própria apreciação da música vire uma espécie de elefante branco, pois o consumo se torna mera finalidade em si, resposta típica de padrões de condicionamento. Tanto é verdade que certamente nunca se consumiu tanta música, no entanto pouca fruição resulta deste tipo de interação. E isso até justifica uma ânsia pela novidade, não fosse esta um dos bordões humorísticos mais calejados pelos mecanismos de promoção e divulgação.

Você vê: quando comecei a escrever este texto, o álbum Broken Toy Soldiers do Racounters sequer fora lançado ou ouvido, no entanto o burburinho em cima do play fora suficiente para ofuscar até os méritos musicais do quarteto, uma vez que, disco disponibilizado aqui na periferia do mercadão de música, é agora apenas mais um CD na prateleira das melhores lojas do ramo. Isto é, quando você ainda o encontra à venda. A tiragem dos CDs aqui no Brasil chegou a ser expressiva? E no caso das picaretagens pop mais escrotas, o encalhe oriundo da miopia mercadológica é quase certeza, seja este oriundo de ânsias por repetições de padrões de venda anteriores ou reedições de hypes caducos de outrora.

E na opinião deste humilde escriba, isto é pouco em se tratando de mais um projeto musical a contar com a categoria do Jack White nas guitarras, o que relega à musicalidade domesticada e sem tempero do comparsa Brendan Benson insignificância e inexpressividade características. Mas é mais fácil vagabundo prestar mais atenção na estampa de vaqueiro no vestuário do sujeito ou no cheiro da bosta bovina a se exalar pela telinha via videoclipe dirigido por Jim Jarmusch (moral, hein!) do que no próprio som do grupo. Em geral, não é cool posar de caipira pop na ribalta midiática a não ser que você queira figurar as fileiras da mudernage conservadora do country alternativo, re-empacotada e avalizada pelos entendidos em música para o jovem. Rock é coisa de Teddy Boy e não para almofadinha, Paul Anka! Assim, mais uma vez, vale a desgastada máxima do sobrinho da Mimi Silva sobre a sedação ao qual somos acometidos pelo condicionamento ao consumo perpetrado sutilmente nas religiões variadas inventadas pelas mídias de massa, razão de ser de uma cultura paulatinamente em vias de desuso. Não que necessariamente esotéricas sejam estas pseudo-religiões, próprias para o consumo, mas capitaneadas por meio da telinha em mediúnica posição de pastor de uma religião baseada no princípio do prazer a ser saciado de forma cada vez mais automatizada. Não importa se é a telinha televisiva, telona do cinema, monitor do PC ou o slide congelado pelos editoriais de quaisquer publicações ou alguma outra interface direcionada ao consumidor. ”Mal aí, colega! Já almocei”. Deve ser tão prazeroso quanto comer defunto ou chamar boneca inflável de meu amor. “Cale a boca e consuma. Você não tem direito de duvidar”. Valeu aí, meu amigo punk-violeiro!

E se nos destitui a individualidade, o consumo voraz de hoje pelo menos parece não permear a facilidade do culto à personalidade. De certa forma é até bom, não fosse esta exaltação à nobreza da abstenção de nossas particularidades em prol do senso coletivo passível de controle por meio de quem capitalize em cima da criação de novos paradigmas, estes de longevidade tão consistente como a de uma borboleta. Isto se reflete de forma contraditória no resenhismo blogger (mea culpa idem), no umbiguismo do desinteressante, nas arrebatadas unanimidades de Clube do Mickey, ainda mais porque mal temos tempo de efetuar leituras atentas ao que acontece no eterno agora. Posto que, em geral, unanimidade é sinal de estreiteza de pensamento em prol do entendimento da maioria, de que adianta liberdade de se dizer o que pensa em pleno vácuo do ciberespaço sideral? Todos somos estrelas de brilho fátuo quanto o piscar de um vaga-lume, pois a profusão de informações despejadas é sobre-humana e a Cientologia ainda não inventou a Pílula da Onisciência. Por esta razão, grande parte destas informações é irrelevante e obviamente convém fazer uso saudável da tecnologia, o que denota uma desaceleração no CONSUMO desta e aqui se faz mister denotar uma distinta acepção da palavra. No entanto, nos condicionamos a consumir tamanha carga de informações oriundas das mais variadas frentes que acabamos nos especializando no supérfluo. O que sugere uma nova apreciação do que nós mesmos qualificamos como supérfluo, desta vez por seu avesso semântico. Também em relação direta ao nosso próprio ato de sorver informação, pois acabamos sendo consumidos justamente por aquilo que consumimos.

Em âmbito musical pop, equivale ao fato de uma banda nova comum sequer possuir tempo hábil para desenvolver uma obra, tamanha é a sofreguidão daqueles fãs de música meramente acometidos pelo fetiche do consumo e não da música propriamente dita. Sei de cor as músicas de meus artistas prediletos, mas hoje se coleciona GygaBytes de arquivos musicais que talvez sequer possa haver tempo hábil para sorvê-los adequadamente, o que acaba sendo uma tremenda ironia. Nunca se escutou tanta música, porém nunca se OUVIU tão pouca música. Peça a algum hypeiro da vez cantarolar trecho de alguma música menos exposta das bandas que já exaltou e aí sinta o drama. Ou encomende ao pessoal daquele hoje gratuito site-hospedeiro de sons um estudo sobre as variedades de espécimes musicais, no qual se baseia o próprio marketing “pessoal” do portal enquanto entidade de música independente, distinto da mera aferição estatística das opções de gênero musicais no cadastro das bandas ou de uma possível atribuição de mérito oriunda de relações prioritariamente não-musicais, o que me remete à máxima de um museólogo em depoimento acerca da ancestral relação entre mecenas e artista, que a meu ver hoje a cibernética coloca em xeque – prosa a ser re-elaborada posteriormente. O mesmo vale para a produção musical, pois as facilidades da produção fonográfica, dispostas ao alcance do usuário comum de computador pessoal, propiciaram um desaguamento imensurável de novas empreitadas, muitas delas concebidas pela mera vontade de manipular estas mesmas ferramentas, excluindo da própria musicalidade em si sua inaptidão de estabelecer vínculo de comunicação mediante alguma informação a ser transmitida ao ouvinte, mesmo que pelo viés da negação ou da inexistência de uma suposta referida mensagem.

E vale lembrar particularidades dos dias de hoje com os primórdios do rock’n roll e da cultura pop, pois ao grosso modo não há uma distinção tão grande entre um álbum de uma grande gravadora e o de um pequeno selo independente. A não ser na quantidade de glacê! Os race records de hoje são os sons fora do comum consumidos pelo viés alternativo em relação ao estabelecido. E a maior diferença entre estes, pelo menos aqui pelo Brasil é sem dúvida a destinação de um maior orçamento para empreitadas chanceladas pela grande máquina. Seja em produção ou em promoção, este fator ainda vigora até o momento de esta distinção se tornar inócua pelo próprio rumo de cada um dos segmentos, o que irá requerer futuramente reajuste ou re-posicionamento nestas polaridades.

Quer dizer, hype é mera ferramenta de promoção, fabricada de acordo com contexto histórico e público. E acaba tudo se tornando mero barulho por nada, pois o que entra por um ouvido sai pelo outro, com pouco aproveitamento. Muito já se ouviu falar de novos nomes fora-de-série do rock que nunca envelhece porque se recusa a amadurecer, mas isso só interessa aos operadores do maquinário que faturam com o funcionamento destes mecanismos, sendo a audiência mera massa de manobra que nem animal de pasto. Vai me dizer que você nunca se deparou com alguém que simplesmente segue os ditames em voga em determinada época? Talvez o leitor até seja mais ou menos entusiasta desta ou daquela tendência. Mea culpa, sim!

A estes amigos, valeria determinado trecho dos diálogos do Dr. Sócrates para seu pupilo Plutão. E o pior é que sempre vai ter alguém para tachar de chato ou cara de melancia qualquer sujeito que tente avaliar de forma mais crítica, na medida do possível e ainda que munido de ferramentas rudimentares ou de mega-aparatos, o cenário no qual somos meros figurantes, sob a pecha de ser “mais um palhaço querendo aparecer” no coro da turminha X, Y ou Z (cum’on, give me a break), quando o mais maneiro é justamente misturar todos os caracteres que nos estiverem à disposição. E olha que tem muito “pele vermelha” torcendo pelo canastrão João Wayne pop institucionalizado no bangue-bangue mestiço encenado nos palcos do rock’n roll globalizado. Sangue azul, suor afro-brasileiro e lágrimas de dançarino de axé. Mas estes são aquela pequena parcela que ainda acredita em hits, como se a popularidade destes não fosse aferida somente pela opulência financeira da ferramenta promocional institucional que vende música para saciar uma demanda de quem compra sabão em pó.

E é neste panorama inócuo que a cultura do hype, do novo pelo novo, encontra berço esplêndido para se instalar enquanto novidade entre uma dada “elite” que não possui nada de singular a não ser a afeição por padrões semelhantes de consumo. E havemos de convir que melhor “o novo pelo novo” que “o revival pelo revival”, ora. Mas por acaso existe alguma fórmula matemática para se mensurar o quão inaudita é uma sonoridade? Você já ouviu toda a música de seu planeta, terráqueo? Mas e se vagabundo entrar numas de “o novo pelo revival” ou então de “o revival pelo novo”? Poxa, pára. Não agüento mais! Ai, que loucuura...

Agora, e o rock enquanto linguagem musical? Onde fica? Ele dissemina-se nas mais variadas tendências, sejam estas retrô ou inovadoras. Melhor não dizer rock, e sim música de atitude enquanto haja a vontade férrea de procurarmos um termo mais adequado. Mas aí estaríamos retornando àquela ladainha dos rótulos, certo? Mas que bosta! Pois é, o conceito de música boa vai variar de pessoa para pessoa, mas na verdade prazer auditivo é aquele adequado para alimentar seu espírito em dado momento. Seja para extravasar ou ressecar um turbilhão de emoções, seja para expurgar ou domesticar as feras que existem em qualquer ser humano que não possua sangue de barata, mesmo que seja para coçar o testículo. Mas na música de atitude (N.R: altere a expressão em negrito sublinhada pela alcunha de seu segmento musical preferido), sobretudo no rock, se sobressai o anjo e a fera que pode existir em qualquer ser humano, aqui também vale a dialética entre passado e presente. Por esta razão, é de nos chamar a atenção o manuseio que Mr. White faz de gêneros cristalizados nas glórias da nostalgia passada para justamente misturar tudo numa massa tanto indistinta que se afigura no melhor de seu trabalho.

O mesmo vale para a contradição que Jack White encarna em sua persona artística neste gênero chamado rock’n roll. É, no mínimo, interessante sacar que a figura mais interessante entre os novos nomes seja um garotão mais ligado à tradição sonora do que propriamente aos “invencionismos” ou às re-paginações sonoras de ocasião. Salve, Odorico! Norma culta para quem precisa dela, mas como isto aqui é meramente um blog... Apesar do verniz passadista, a abordagem que o sujeito faz da nostalgia musical tem um quê inegável de atualidade. Você provavelmente não há de perceber ligação alguma, mas do outro lado do mundo o cara do Radiohead atua este mesmo papel, ainda que complemente a persona nostálgica do Jack White e este se assemelhe mais a um complemento da iconoclastia artística do Radiohead em seus melhores momentos de esquizofrenia musical – aqui no melhor sentido do termo – pós-Kid A.

O disco propriamente ouvido do Raconteurs, “Broken Toy Soldiers”, deixa bem claro que o papo de resposta inglesa ao Nevermind é pura balela. A conexão mais possível seria justamente para a contribuição de Brendan, que dá um toque “Beatle - I wanna hold your hand” ao som do quarteto, notadamente com o aval de White. Longe de ser propriamente um coletivo musical, sobressai-se a verve de White. Os arranjos não destoam de nada que poderia ser apropriado pelo White Stripes, vide os lados B recentes do duo. O álbum nada, ou quase nada, tem a ver com Nevermind e essa é uma das grandes ironias do lance: a de vagabundo tirar próprio sarro com slogans marketeiros, pois sempre ficará mais fácil recorrer-se ao fóssil, justamente para mostrar o quão vazias são estas frases feitas pelos departamentos de promoção. E há quem as compre, diga-se. Para rolar uma reedição daquelas, o espírito de época passada haveria de estar contemporaneamente entranhado nas vísceras de quem se dispusesse. Mas aí é quando o rock vira uma piada interna para quem se disponha a rir, pois repetir um padrão consolidado é mérito apenas no picadeiro de planeta dos macacos ou nas festinhas de playground que viram modinha para quem tem saudade da infância. Mas não deixa de ser oportunidade para uma penseta (valeu aí, Pepe Legal) e digressões acerca de nosso gênero musical predileto. Nos falamos quando sair o novo Radiohead. Inté...
Continua?

Texto de Marcus Marçal
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