O SOM DA MÚSICA: ENTREVISTÃO XXXII: "O Trovador Solitário" demonstra boa fase do compositor Renato Russo, diz pesquisador

Friday, October 24, 2008

ENTREVISTÃO XXXII: "O Trovador Solitário" demonstra boa fase do compositor Renato Russo, diz pesquisador

14/07/2008 - 14h06
MARCUS MARÇAL
http://musica.uol.com.br/ultnot/2008/07/14/ult89u9353.jhtm

Registros inéditos de Renato Russo chegam às lojas com o lançamento do álbum "O Trovador Solitário". O disco é uma iniciativa do produtor e pesquisador musical Marcelo Fróes, que compilou material gravado por Russo em 1982, aos 22 anos, de forma artesanal, em sua casa, em Brasília, antes de criar a Legião Urbana, no ano seguinte.

"O Trovador Solitário" foi a alcunha com a qual Russo passou a se autodemoninar após o fim de sua primeira banda, o Aborto Elétrico. Antes de formar a Legião Urbana, banda com a qual se notabilizaria anos depois como uma das principais personalidades do rock no Brasil, o cantor fez apresentações solo em Brasília e este CD documenta esse período na trajetória do artista.

O CD é um lançamento do selo Discobertas, com distribuição da gravadora Coqueiro Verde, e contém onze faixas que se tornariam clássicos da música pop brasileira como "Faroeste Caboclo", "Eduardo e Mônica", "Eu Sei", conhecida na época como "18 e 21", entre outras versões embrionárias.

Os registros foram feitos originalmente em um gravador portátil, mas o áudio foi remasterizado para este lançamento em CD. Uma das faixas, "Boomerang Blues", já foi lançada no álbum "Renato Russo Presente" (2003), composição de Renato, que aparece em uma versão finalizada com a participação de integrantes do grupo Blues Etílicos em 2003. "O Trovador Solitário" também apresenta um dueto de Renato Russo e Cida Moreira, em "Summertime", clássico dos anos 30 composto por Du Bose e os irmãos George e Ira Gershwin.

Impasse quanto ao espólio da Legião Urbana
Marcelo Froés falou em entrevista ao UOL sobre o lançamento, por email, com autorização da família de Russo. E destacou que o material talvez demonstre a sua melhor fase como compositor, pois "compunha instintivamente" durante o período. Froés também falou sobre o desentendimento entre os ex-integrantes da Legião Urbana e os detentores do espólio do cantor, polêmica originada com o lançamento do disco "As Quatro Estações Ao Vivo", segundo o produtor material que o próprio Renato vetara o lançamento em 1990.

"Houve muita movimentação por parte dos sobreviventes, para que a família abrisse mão do que era de Renato já em vida. O descontentamento gerou ressentimento e infelizmente o distanciamento mostra que a gravadora também teve muita culpa nisso", declarou. Froés também destaca que a família não moveu processo, mas não aceita o lançamento do disco "As Quatro Estações Ao Vivo" (2004). Segundo o produtor, trata-se de um disco "fake, com instrumentos regravados quinze anos depois, como se soube só depois, e com as falas de Renato limadas da edição", conforme enfatizou na entrevista.

Por outro lado, o ex-guitarrista da Legião Urbana, Dado Villa-Lobos desmente as afirmações de Froés e declarou que esse foi o último disco do grupo. "O trabalho da Legião Urbana sempre foi pautado pelo respeito entre seus integrantes e as questões artísticas do grupo são fechadas", declarou.

Villa-Lobos hoje segue em carreira solo e afirma não entender o julgamento de Froés. Quanto aos procedimentos na produção do disco ao vivo, o músico desmente a versão do produtor. "Nós conhecíamos muito bem o Renato e editamos apenas comentários duvidosos que poderiam ser mal-interpretados a fim de preservar sua imagem. Temos a absoluta certeza de que ele estaria de acordo com os procedimentos-padrão que adotamos na produção do disco. Tínhamos muito respeito entre nós", critica.

Hoje, Villa-Lobos está envolvido com outros projetos musicais e prefere não mais se manifestar sobre o assunto. "O Renato agora está lindo lá no céu e esse é o tipo de projeto que eu prefiro não me envolver. Infelizmente, é um assunto muito chato, pois minha vida seguiu em frente e estou envolvido com outros projetos", disse.

Desde a morte de Russo em 1996, sete discos e dois vídeos póstumos ("Legião Urbana - Acústico MTV", lançado em homevideo em 1999 e "Renato Russo - Entrevistas MTV, de 2007") já foram lançados -- tanto trabalhos solos ou com a Legião Urbana.

Veja entrevista abaixo com o produtor e pesquisador Marcelo Froés:

UOL - O que constitui o material compilado em "O Trovador Solitário"? São gravações reunidas aleatoriamente ou fazem parte, especificamente, de determinadas sessões de estúdio realizadas por Russo antes de formar a Legião?
Marcelo Fróes - O material principal do CD é a fita demo gravada por Renato Russo em 1982, fase em que se auto-intitulava "O Trovador Solitário". Desde o fim do Aborto Elétrico em dezembro de 1980, ele vinha compondo e fazendo shows acústicos sozinho. Os amigos lhe pediam que gravasse as canções, então ele entrou no quarto com um gravador e registrou as demos de nove canções - dentre as quais as longas "Eduardo e Mônica" e "Faroeste Caboclo". Estas nove faixas compõem o material principal do CD, que traz também, como faixas bônus, primeiramente a demo original de "Que País é Este" (composta em 1978); e uma gravação ao vivo de "Summertime" com a amiga cantora Cida Moreira, registrada num show informal no verão de 1984. O CD documenta, portanto, aquela fase pré-histórica do cantor e compositor, antes do estouro da Legião Urbana (1983-1996).

UOL - Qual é o valor histórico das gravações compiladas em "O Trovador Solitário"?
Fróes - Mostrar que, antes mesmo de formar sua segunda banda, Renato já compunha e finalizava clássicos que o mercado fonográfico e a mídia só viriam a conhecer quatro ou cinco anos depois. Para fãs, colecionadores e historiadores da música brasileira, alvo dos lançamentos do selo Discobertas, em parceria com a gravadora Coqueiro Verde, é um grande presente. Além disso, esta fita é histórica; foi uma cópia dela que Herbert Vianna levou para a direção de sua gravadora, que se interessou pelo jovem cantor e compositor folk sem saber que ele estava formando uma banda de rock.

UOL - Russo tinha noção do valor de suas músicas já nessa época?
Fróes - Ele já era uma lenda entre os amigos de geração em Brasília. Suas canções já eram conhecidas da turma. Renato registrava bem suas letras, em cadernos e em papéis datilografados, datados e assinados.

UOL - Vocês pensaram na possibilidade de incluir material solo de Russo, aos moldes voz e violão, posteriores a criação da Legião Urbana como versões embrionárias ou coisas do tipo?
Fróes - É possível, mas isso até já foi feito. O próprio Renato incluiu coisas solo suas em discos da Legião. "Eduardo e Mônica" é praticamente uma versão solo sua, no disco "Dois" de 1986. Depois, mais tarde, quando montou o disco "A Tempestade", ele mandou incluir uma demo solo sua de "1º de Julho", gravada com o produtor Carlos Trilha durante as sessões de seu primeiro álbum solo em 1994. Por fim, no lançamento do CD póstumo "Uma Outra Estação", foram incluídas novas demos solo de Renato para "Marcianos Invadem a Terra" e "Dado Viciado", gravadas só por ele no estúdio da gravadora ainda nos anos 80.

UOL - O material composto na fase "trovador solitário" de Russo demonstra seu amadurecimento definitivo como compositor?
Fróes - Talvez demonstre sua melhor fase, aquela em que ele efetivamente compunha instintivamente. Muitas das canções dos discos da Legião Urbana nasciam de jams intermináveis, montadas em estúdio. Criavam-se harmonias ao longo de meses e só no final Renato vinha com a melodia e com a letra, na hora de adicionar o vocal. "Índios" nasceu assim, e "Sagrado Coração" é o exemplo de uma canção que ninguém jamais poderá cantar. O disco "Uma Outra Estação" traz apenas sua harmonia, uma base sem a melodia da voz de Renato. A letra até está lá, mas ninguém sabe como seria a melodia. Ele nunca colocou voz.

UOL - Antes de morrer, Russo deixou instruções sobre como deveria ser trabalhado seu material póstumo? Ou chegou a conceber, em algum momento, a possibilidade de litígio entre os detentores de seu espólio e os ex-integrantes da Legião Urbana?
Fróes - Renato não deixou instruções específicas, mas a família de todo modo apenas administrou a situação que recebeu. Ele sabia das sobras e, como conhecedor das lendas do mundo pop, e sabedor de sua grandeza, como ícone de uma geração e como grande vendedor de discos, tinha certeza de que as coisas seriam aproveitadas um dia. Ele tinha muitas gravações guardadas em casa e, como passava boa parte do seu tempo em casa, teve tempo de destruir o que não desejava que alguém viesse a conhecer. Quanto à possibilidade de litígio com ex-integrantes da banda, ela já existia e disso os amigos próximos sabiam. Quando Renato registrou a marca Legião Urbana para si no INPI ainda nos anos 80, vendo a briga que rolava na justiça por nomes como Pink Floyd, ele sabia que um dia poderia ter aborrecimento. Mas, de qualquer forma, todos os membros da banda tinham um mesmo empresário e um mesmo advogado e supõe-se que os assuntos da banda fossem pacíficos. Mas não eram.

UOL - Se Russo não chegou a se manifestar quanto a essa possibilidade, como você acha que seria sua opinião a respeito do desentendimento entre a família do cantor e os ex-integrantes da Legião Urbana?
Fróes - Não faço idéia, mas tudo aconteceu simplesmente porque a família recebeu uma situação para administrar e seguiu à risca, principalmente por haver interesse de menor em jogo à época. Ninguém podia sequer transigir. Houve muita movimentação por parte dos sobreviventes, para que a família abrisse mão do que era de Renato já em vida. O descontentamento gerou ressentimento e infelizmente o distanciamento mostra que a gravadora também teve muita culpa nisso. É verdade que Renato sempre bateu de frente com a direção da companhia, mas de qualquer forma as diretorias que passaram por lá depois de sua morte nunca souberam conduzir a situação com imparcialidade, chegando ao cúmulo de tomar partido e de lançar um disco não autorizado em 2004, tudo porque ano após ano a gravadora dependia das vendagens de Renato e de sua banda para fechar suas contas e garantir o emprego dos diretores. Desde então, o assunto Legião Urbana ficou em suspenso e a família ainda aguarda uma postura mais madura da parte de cada um dos que precisam explorar comercialmente o legado da banda, para voltar a tratar daquela realidade que a morte de Renato Russo tornou irreversível. A grande verdade é que nunca mais nada da banda poderá sair, a não ser que efetivamente autorizado por todas as partes interessadas. A família não moveu processo, mas até hoje não aceita aquele lançamento pirata de 2004, quando foi lançado um disco ao vivo que o próprio Renato vetara em 1990. Principalmente porque é um produto fake, com instrumentos regravados quinze anos depois, como se soube só depois, e com as falas de Renato limadas da edição --fruto de uma época em que ainda havia muita arrogância e vaidade no mercado. Hoje espero que estejamos na era da imparcialidade e da transparência.

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