O SOM DA MÚSICA: ENTREVISTÃO XXIV: "Seria pedante nos responsabilizarmos pela evolução do tango", diz fundador do Bajofondo

Friday, October 24, 2008

ENTREVISTÃO XXIV: "Seria pedante nos responsabilizarmos pela evolução do tango", diz fundador do Bajofondo

13/05/2008 - 18h27
MARCUS MARÇAL
http://musica.uol.com.br/ultnot/2008/05/13/ult89u9050.jhtm

Em sua terceira turnê brasileira, o octeto argentino-uruguaio Bajofondo se apresenta nesta quarta-feira (14) no Via Funchal, em São Paulo, e depois toca em Porto Alegre na sexta (16). Formado em 2001, o grupo se notabilizou pela mistura de tango e música eletrônica, com pitadas de rap e pop-rock e outras manifestações de música latina tradicional, como a milonga e o candombe.

Como aconteceu com os pioneiros do "Gotan Project", sua sonoridade também foi tachada de "tango eletrônico", mas seus integrantes preferem denominá-la atualmente como uma versão pós-eletrônica do gênero, devido à menor utilização de programações eletrônicas e uma maior atenção à música tradicional da região do Rio da Prata.

Junto a Gustavo Santaolalla (guitarra, percussão e vocais), Juan Campodónico (programações, sampler e toca-discos) é um dos principais responsáveis pela identidade musical do grupo. O compositor falou ao UOL de Montevidéu, no Uruguai, sobre as apresentações do Bajofondo no país, em que destaca temas de seu mais recente álbum de estúdio, "Mar Dulce" (2007), além de material inédito.

O Bajofondo é ainda formado por Martin Ferres (bandoneon), Luciano Supervielle (piano, toca-discos e programação), Veronica Loza (voz e VJ), Javier Casalla (violino), Gabriel Casacuberta (contrabaixo) e Adrian Sosa (bateria). O grupo já passou pelo Brasil em 2003 e 2007 e, em sua discografia, também constam os álbuns "Bajofondo Tango Club" (2002), "Supervielle" (2004) e "Bajofondo Remixed (2006).

UOL - Quais são as expectativas em relação à terceira passagem do Bajofondo pelo Brasil?
Juan Campodónico: Da última vez que viemos ao Brasil, promovemos o álbum "Mar Dulce", mas nesta turnê também tocaremos músicas inéditas. Esse material é no estilo Bajofondo, mas possui orientação maior à música cantada. Particularmente, sou fanático pela música brasileira. Comecei a escutar todos os discos de bandas como Titãs e Legião Urbana --só depois eu voltei no tempo para ouvir o trabalho de Gilberto Gil, Caetano Veloso e todos os artistas da Tropicália. Essas viagens ao Brasil foram muito ilustrativas, pois me mostraram o lugar onde essa música se originou --no que diz respeito a situações sociais e geográficas. Sempre que visito o país, volto com muitas informações e é uma experiência riquíssima do ponto de vista pessoal --ainda mais porque sempre volto para casa com muitos discos de novidades locais. Sobretudo porque, a meu ver, o Brasil é uma das grandes potências do mundo, em âmbito musical. E agora o Bajofondo tem a oportunidade de mostrar sua música em grandes turnês pelo mundo, com passagem por todas as capitais européias, além de tocar em lugares interessantes como São Paulo --o que é uma experiência muito bonita.

UOL - A música do Bajofondo é erroneamente tachada como "tango eletrônico" por ser uma expressão particular e contemporânea de world music proveniente da Argentina e Uruguai?
Campodónico: Bajofondo é mais do que um grupo musical tradicional. A meu ver, é uma aliança entre músicos e um estilo de música. Eu e Gustavo nos juntamos em 2001 e começamos a planejar esse projeto como uma experimentação. Nosso primeiro álbum é como uma experiência de laboratório de produção e utilizamos referências relacionadas ao passado da música do Rio da Prata, mas também com um quê de atualidade. O próprio nome de nosso primeiro disco, "Bajofondo Tango Club", já esclarecia um pouco do que se tratava nossa música: com referências ao tango e à música latina muito genericamente, ao mesmo tempo em promove conexões com o que acontece hoje em dia nos clubes. Fomos associados a outros trabalhos similares dessa corrente chamada "tango eletrônico" e sentimos que a definição não correspondia à totalidade de nossa música. Não fazíamos apenas tango ou música eletrônica, pois diria que, em nosso trabalho, há outras referências de música contemporânea --como rock, rap, pop-- a partir de nossa perspectiva particular de mundo típica do Rio da Prata. Por outro lado, também não fazemos apenas uma abordagem de tango, mas também pesquisamos outras manifestações de música tradicional como a milonga e o candombe. Por essa razão, não achamos correto que nossa música seja associada à corrente de tango eletrônico, apesar de termos essas referências em nosso som. Preferimos que as pessoas definam nosso trabalho como música contemporânea do Rio da Prata, pois representa para o mundo o lugar onde estamos -- uma música muito universal com intenção de ser entendida no mundo globalizado.

UOL - O Bajofondo é responsável por manter viva a linguagem tradicional do tango argentino, ao modernizá-lo com referências contemporâneas?
Campodónico: Acho que não. Creio que o tango incorpore muitas manifestações e seria muito pedante afirmar isso -- comparavelmente à hipótese de um grupo brasileiro chamar a si próprio a responsabilidade de manter o samba vivo. E isso não procede, pois o samba é uma coisa muito ampla e com muita história, além de representar uma tradição musical a sua própria maneira. Mas, ao mesmo tempo, o samba e o tango são formas musicais muito contemporâneas e se consolidaram na América, um continente novo, onde se misturaram europeus e africanos. Além dos vários ingredientes que os constituem, ambos são gêneros muito novos para o mundo. Quero dizer: o tango é como a música brasileira ou a música afro-norte-americana, pois --por mais que nos sejam músicas tradicionais-- são manifestações muito recentes para o resto do mundo, repletas de conexões e muito vivas no que diz respeito à capacidade de gerar novas sonoridades o tempo todo. E o tango nunca parou de se transformar permanentemente no decorrer dos séculos, portanto não poderíamos nos responsabilizar por sua evolução. O gênero está vivo e nós queremos explicitar com nosso trabalho uma tradição particular da região do Rio da Prata, ao mesmo tempo em que também utilizamos referências mais globalizadas como a house music, rap ou rock. Tentamos salientar referências à peculiar manifestação musical típica da parte do mundo onde vivemos, pois nos parece que essas coisas precisam ser defendidas em todos os sentidos --no que diz respeito à manutenção da tradição e à criação de novas possibilidades musicais.

UOL - O que você destaca na evolução da linguagem musical do tango atualmente?
Campodónico: Há muitas formas, mas a última grande manifestação vanguardista do gênero foi capitaneada por Astor Piazolla (1921-1992). No entanto, do ponto-de-vista dos músicos mais tradicionais, sua música não poderia ser chamada de tango. Mas se concebermos as coisas a partir de nossa perspectiva atual, a música de Piazolla está viva e faz parte de uma tradição do tango. Guardadas as devidas proporções, isso também aconteceu conosco, pois continuamos fazendo tango porque nossa música tem uma alma oriunda do gênero, mas não se restringe a isso. Em termos gerais, a partir do começo do século, começou a ganhar força, um movimento de volta ao passado, a fim de se promover a recuperação de antigas referências em distintas manifestações artísticas --tanto no tango mais tradicional, da velha escola e coisas intermediárias-- diferentemente de se promover um pastiche de rock, blues e jazz. E assim desenvolvemos uma maneira própria de expressar nossa musicalidade, característica de uma determinada região do planeta. Mas a mistura se dá naturalmente, pois também escutamos músicas de outros lugares.

UOL - O tango é um gênero mais ligado à tradição do que à evolução de sua linguagem musical?
Campodónico: Creio que a história do tango se divida em muitas etapas e alguns artistas estão mais envolvidos com determinadas facetas do gênero. É um estilo musical com muitas glórias passadas -- dos anos 20, de Gardel nos anos 30, das grandes orquestras nos anos 40 e daí em diante. É uma música que se desafoga em várias vertentes, com uma linguagem musical muito particular e genuína de uma idiossincrasia que se realiza em uma sonoridade única.

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