DE ORELHADA III
Stress, Depressão & Síndrome de Pânico – Autoramas (Astronauta Discos / Universal)
Punch sem Estresse
A homogeneidade entre as treze faixas do álbum de estréia dos Autoramas confirma o potencial comerical do repertório com o qual o power trio vinha se notabilizando em shows. Pura nitroglicerina pop em canções que funcionam bem tanto nas pistas de dança, nas rádios ou mesmo em shows. Sem medo, pode-se arriscar desde já que a bolacha é um dos melhores lançamentos deste ano do segmento pop-rock do mercado fonográfico nacional.
Em disco, o mix de Jovem Guarda, new wave, surf music e rock`n roll básico promovido pelo grupo ganhou nuances pop mais nítidas do que se percebe nas apresentações ao vivo, em parte pela ótima produção de Carlo Bartolini, ex-guitarrista do Ultraje a Rigor e que de uns tempos para cá vem se notabilizando pela calibragem nos registros sonoros de novos destaques do rock brasileiro.
Stress, Depressão & Síndrome de Pânico traz como destaque “Eu Não Morri”, carta de apresentação do trio em sua única demo, aqui em uma versão poderosa, em razão dos overdubs de guitarra. Aliás, vale ressaltar que a maioria das letras do disco flerta com uma saudável egolatria, em recados diretos para desafetos e recalcados de plantão, conforme também atesta “Ex-Amigo”.
Um certo upgrade de Jovem Guarda ganha forma em “Carinha Triste”, canção perfeita para tocar no rádio e na qual o grupo faz elo com os primórdios do rock brasileiro. Nela, o pessoal dos Autoramas aponta possibilidades ignoradas por várias bandas novas, pela simples vergonha que estas sentem de se tornarem bandas pop ao dialogarem com referências mais populistas.
Um flerte com a surf music também se desenha nas instrumentais “Jogos Olímpicos” e “Bahamas”. Em “Catchy Chorus”, o grupo volta os olhos ao passado underground cheio de futum adolescente. Tudo isso com um certo ceticismo contra a exaltação que geralmente se atribui aos artífices de canções pop memoráveis alçados à condição de “gênios”, pois já são calejados nos subterrâneos do udigrudi por intermédio de suas experiências anteriores, o que os deixa imunes quanto a qualquer deslumbramento desmedido.
Gabriel Thomaz (guitarra e voz, ex-Little Quail), Simone do Valle (baixo e vocais, ex-Dash) e Wagner Bacalhau (ex-Planet Hemp) parecem bastante seguros sobre como agir diante da mentira inerente ao meio artístico em geral e também quanto ao que podem usufruir deste belo disquinho de estréia com latente potencial radiofônico. Em bate-papos recentes, eles chegaram a declarar que seu público-alvo é uma galera que curte rock mais pesado. Se isso for verdade, e se o trio não derrapar em sua trajetória, temos aí a primeira grande banda do rock brasileiro da década que se inicia.
Texto de Marcus Marçal publicado em 02 de março de 2000 no jornal Gazeta do Povo (Curitiba/PR). Não é permitida a reprodução deste texto de forma alguma sem permissão prévia, seja em sua forma integral ou parcial. Por favor, contate-me antes via email.
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